Uma assumiu estilo fashion. A outra, é mais debochada. Em comum, são mulheres na casa dos 70 anos que descobriram nas redes sociais um novo sentido para a vida e se tornaram influenciadoras digitais.

O termo influenciadoras pode parecer desgastado mas, no caso delas, influenciam tanto pessoas da mesma idade –com a mensagem de que a vida deve continuar ativa nessa faixa etária– como jovens, que veem nelas uma inspiração para o futuro (“quando eu crescer quero ser igual a você” é uma das frases mais presentes nos comentários).

Estamos falando de Izaura Demari, ou @voizaurademari no Instagram

E Dirce Ferreira, ou @donadirceferreira no Instagram, que se autointitula a vovó mais doida do Brasil.

Vovó Izaura, 78, mora com o filho Márcio Demari em São José, na Grande Florianópolis (SC). Após a morte do marido, começou a viajar e nunca mais parou. Chegou a ir quatro vezes ao ano para Gramado (RS). Tempos atrás, enfrentou um problema de pele, e por isso passou a andar sempre acompanhada de um elegante chapéu. Durante essas viagens, moldou o estilo de cores vivas e vibrantes que hoje carrega. Um dia o filho postou uma foto na internet, fez sucesso e nunca mais pararam. Os seguidores só cresceram –são 34 mil atualmente.

Dona Dirce, 72, mora em Uberlândia (MG) e criou o perfil em abril deste ano. Em sua primeira publicação, aparece dançando sorridente no meio da cozinha. “Essa sou eu fazendo umas das coisas que eu mais gosto, dançar e malhar!” Em maio, uma neta que mora no exterior fez um ensaio sensual e a avó resolveu imitar as poses. Uma segunda neta pediu para publicar as fotos no perfil. Resultado: hoje ela tem 125 mil seguidores, os quais chama de “seguinetos”.

A trajetória de Izaura e Dirce guarda semelhanças antes e depois da fama. O reconhecimento é um ponto em comum.

Se Izaura anda em Gramado, é reconhecida. Se vai ao shopping em Florianópolis, também. Quando esteve em setembro na Expo Longevidade, em São Paulo, mal conseguia andar com a fila que se formou para abraços e selfies.

Com Dirce não é diferente. O telefone não para de tocar. É entrevista atrás de entrevista. O negócio explodiu quando participou do programa da Fátima Bernardes, na TV Globo, e viveu a experiência de ser “repórter por um dia” no Rock in Rio –papel que desempenhou com desenvoltura, aliás. “Menino, está uma loucura”, resume.

Convencer pessoas da idade delas de que é possível chegar nessa fase da vida e experimentar coisas diferentes não é uma tarefa fácil. Izaura costuma visitar casas de repousos para doar parte de sua coleção de roupas e acessórios. Muitas se negam a usar as peças extravagantes “por causa da idade”. “Eu falo: ‘por causa da idade? Você é mais nova que eu! Usa também que fica bonita’”.

E elas são ousadas. Assim como Dona Dirce, Vovó Izaura também publicou fotos em que está sem seus habituais trajes reluzentes, apenas de calcinha e sutiã. Viralizaram, claro. Mas houve reações de familiares. Seus netos falaram que ela estava indo muito para a frente, o filho disse “mãe, que isso”, as irmãs, mais conservadoras, inicialmente se espantaram. Passado o susto inicial, todos acabaram apoiando.

“Uma amiga veio meter a boca. E o que eu fiz? Tirei uma foto ainda mais ousada, para provocar mesmo”, diverte-se Izaura.

O mundo das redes está longe de ser um ambiente paradisíaco. Até as vovós têm de lidar com haters. Dona Dirce diz que 98% dos seguidores consideraram artístico seu ensaio que imitava a neta, mas teve aqueles 2% de comentários raivosos do nível de “Ridículo! Essa velha em vez de estar criando os netos está posando pelada”. Ela diz não se abalar. “Opiniões existem, mas eu não tenho nenhum preconceito, então está tudo certo desde que você goste do que está fazendo”.

Como boas influenciadoras, Izaura e Dirce recebem convites para ir a eventos e palestras e dar entrevistas. Elas são cobiçadas diariamente por marcas, interessadas no alcance e engajamento que as vovós possuem.

Márcio, o filho de Izaura, acabou virando seu empresário. Além de administrar as redes sociais, é ele quem gerencia quais eventos ela irá participar e quais marcas ela divulgará ou não. “Tenho a preocupação de só aceitar aquelas que combinam com a mensagem que a minha mãe transmite. Não posso falar de refrigerante se ela passa a imagem de vida saudável. Não posso aceitar uma roupa se ela não costuma usar. A internet não perdoa a reputação de quem tenta se vender diferente do que é”, afirma.

Dona Dirce também doa seus “recebidos” (como blogueiras chamam os produtos que recebem para divulgação). Ela chegou a receber propostas de exclusividade, mas até agora não cedeu. Prefere divulgar tudo, a contragosto da neta.

Outro assunto que sempre aparece é a vida amorosa. Izaura, viúva, não quer saber de mais nada, apenas de aproveitar a companhia dos filhos, netos e fãs, embora vez por outra apareçam algumas cantadas, ignoradas por ela.

Dona Dirce tem um perfil mais assanhado e o assunto paquera sempre aparece em suas conversas. “Se eu fosse querer ia querer um menino igual a você, não ia querer alguém mais velho”, diz, às gargalhadas, antes de revelar que arrumou um flerte a distância, pelo Tinder. Ainda não se conhecem pessoalmente, mas a vontade existe.

O dia de Dona Dirce é agitado. Começa antes das 6h da manhã, com meia hora de exercício físico. Depois, cuida da casa, das plantas e faz almoço. De tarde é hora de ir para o salão de costura trabalhar até por volta das 18h. No meio disso tudo, se arruma para as publicações de divulgação. Termina o dia respondendo, ela mesma, as centenas de mensagens diárias que recebe nas redes.

“É bom demais. Eu sou muito disposta, não me canso. Gosto mesmo é da correria”.

GERAÇÃO A
Izaura e Dirce estarão em São Paulo para o evento Connectors, que acontece no Centro de Convenções Frei Caneca nos dias 23 e 24 de novembro. Serão 46 painéis sobre a importância dos meios digitais para garantir e manter a visibilidade do influencer, além de discutir a profissionalização do ofício de influenciador digital. Um deles, o “Geração A: Seguimos no Jogo”, com as duas.

Luciana Medeiros, CEO da The Marketing Arm, idealizadora do Connectors, prefere usar o termo “geração A” ao se referir aos influenciadores mais velhos. “Melhor idade, geração X, vamos combinar, nenhum transmite a ideia bem. Geração A veio de uma brincadeira, de quem chegou primeiro, o início do vocabulário”, diz.

A ideia do painel, segundo ela, é mostrar que as redes podem dar uma sobrevida e trazer uma nova alegria nessa fase da vida. “No caso das nossas convidadas, foram filhos, netos, que tiveram a iniciativa de dar o impulso inicial nas redes. Então, a gente quer incentivar que outros filhos e netos deem esse empurrão”, afirma Luciana Medeiros.

A organizadora acompanhou uma mudança significativa nesse meio de influenciadores. Ela, que trabalhou por mais de 15 anos como empresária de artistas, lembra que antes todo mundo queria ser “jogador de futebol e modelo”. Hoje, todo mundo quer ser influenciador.

“As pessoas precisam conhecer os passos para ser um bom profissional. Todo mundo pode empreender no mundo digital”, diz Luciana Medeiros.

Izaura e Dirce estão aí para provar que isso é verdade. Não importa a idade.

MAIS GERAÇÃO A
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