Após vazamento de dados, usuários publicam compras que teriam sido feitas com cartão de Bolsonaro
Após a divulgação de dados pessoais do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de dois de seus filhos, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), usuários publicaram nas redes sociais compras que sugerem terem sido feitas com o cartão de crédito das autoridades públicas.
“O cartão do Bolsonaro funcionou”, escreveu um usuário no Twitter. A publicação está acompanhada do print da compra de um iPhone 11, com entrega prevista para esta quarta-feira (3). O aparelho da Apple foi lançado em dezembro do ano passado com preço a partir de R$ 4.999 no Brasil. “Passa aí men [o número do cartão]”, comentou outro usuário na mesma postagem.
Em outra publicação, uma usuária compartilha print de uma compra no valor de R$ 3.454,95 feita no site das Casas Bahia também com o cartão que seria do presidente. “Alguém me ajuda, eu fiz na brincadeira”, escreveu a usuária, dando a entender que estaria em uma enrascada.
As informações pessoais foram vazadas nesta segunda (1º) por um perfil que se identifica como sendo do grupo de hackers Anonymous Brasil. Além dos dados de cartões de créditos, foram divulgados números de CPF, telefones e WhatsApp, emails, endereço, renda e bens que seriam das autoridades. Pouco depois as informações foram retiradas do ar.
A “lacração” de alguns usuários na internet, porém, tem seu preço. O ato de fazer compras com o cartão de crédito de outra pessoa, sem autorização, pode ser enquadrado pelo artigo 155 do Código Penal como furto mediante fraude. A lei prevê pena de 2 a 8 anos de reclusão.
Também configura ato criminoso divulgar uma tentativa de transação com o cartão de outra pessoa, mesmo que a compra não tenha sido finalizada. Nesse caso, os usuários podem ser enquadrados no artigo 287 do Código Penal, que prevê pena de 3 a 6 meses de detenção ou multa por apologia ao crime.
Apenas o compartilhamento de informações sigilosas publicadas por terceiros pode configurar ato ilícito, de acordo com a advogada especializada em direito digital Patricia Peck. Nesse caso, o artigo 154 do Código Penal prevê aumento de pena caso as informações sejam do presidente, governadores ou prefeitos. A pena é de três meses a um ano de reclusão ou multa.
“Quem dá mais exposição ou passa adiante uma informação sigilosa também executa a mesma prática, disseminando fatos confidenciais. É como se o usuário tivesse participado da execução da atividade”, diz Peck.
Um dos motivos que faz as pessoas compartilharem tais crimes na internet é a sensação de impunidade no mundo digital, segundo Ronaldo Lemos, advogado e colunista da Folha. Ele afirma, porém, que no Brasil, as informações nas redes têm sido cada vez mais usadas como prova para o combate de organizações criminosas.
“Tudo que é feito na rede deixa rastros. A internet não é lugar anônimo”, diz Lemos. Mesmo com o uso de um pefil fake, sem nome ou foto verdadeiros, há uma série de possibilidades para identificar o real autor das mensagens, entre elas o rastreamento do endereço de IP (internet protocol, identificação virtual na rede) mediante ordem judicial prévia.
Nesta terça, Bolsonaro classificou a divulgação como “clara medida de intimidação”. Em uma publicação no Facebook, o presidente também disse que está adotando medidas legais contra os responsáveis. O Ministério da Justiça determinou à Polícia Federal a instauração de um inquérito para apurar o vazamento.
Além da família Bolsonaro, também foram expostas dados que seriam da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, do ministro da Educação, Abraham Weintraub, e ao deputado estadual Douglas Garcia (PSL-SP).
Um outro perfil também criado pelo Anonymous chegou a publicar fotos de um dos documentos. Um deles mostra o registro de uma empresa digital, com capital social de R$ 1.000, em nome de Bolsonaro e dos filhos. O endereço não foi exposto, mas o grupo incluiu uma foto da casa onde a empresa estaria registrada.