Precisamos fazer da ciência um assunto mais presente nas redes sociais, diz reitor da Unicamp
O Instituto Serrapilheira e a Agência Bori lançaram no Dia da Ciência, em 8 de julho, a campanha #CientistaTrabalhando, em que convocam colunas e blogs de todo o país a ceder seus espaços para cientistas no mês de julho para que cientistas abordem todo o processo científico, e não apenas os resultados.
Quem ocupa o #Hashtag nesta segunda (27) é Marcelo Knobel, físico e reitor da Unicamp.
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Façamos uma experiência simples e interessante: dar a um jovem ou a uma criança um telefone com disco ou uma máquina de datilografar. Estaremos diante de uma imediata reação de estupefação. É provável que muitos deles não saibam o que é nem como funcionam esses aparelhos “esquisitos”. Um sentimento de melancolia paira no ar ao reconhecermos objetos presentes em nossas casas até pouco tempo, mas que viraram relíquias. É que todo o restante veio tão rápido que não nos demos conta. Telefone sem fio, celular tijolão, celular StarTAC, iPhone, redes sociais, telas multitoques por todos os lugares, aplicativos para comprar apartamento, filtro para ficar com cara de velho ou de bebê. Piscamos e… Como era mesmo viver sem tudo isso? É recorrente nos sentirmos incapazes de acompanhar todas essas transformações, e o resultado é a enorme angústia batizada deFoMO (fear of missing out, ou medo de estar perdendo algo).
Essas consequências negativas, evidentemente, são superadas (ou maquiadas?) pelas vantagens das novas tecnologias. Por exemplo, temos vivido uma verdadeira revolução na área de comunicação, mas só nos damos conta disso no plano mais superficial, o do uso. Não notamos quanta ciência tem sido necessária para realizar os desenvolvimentos tecnológicos que experimentamos. Não percebemos as incríveis dificuldades que tiveram de ser superadas para serem realizados alguns avanços que passam praticamente despercebidos. Somos apresentados ao novo, depois ao mais novo, e assim cada peça do dominó da inovação cai de forma automática. E aí começam a aparecer pontos mais complexos. Quando nos damos conta, o mercado de trabalho já se transformou. E isso não toma de assalto apenas indivíduos ou empresas. O poder público (não apenas no Brasil) vive muitos passos atrás das mudanças. Vejam exemplos como aplicativos de transporte individual ou de entrega de comida: quantos anos leva até que prefeitos, governadores, vereadores, deputados pensem em como assimilar as novidades e estabelecer políticas adequadas.
Atualmente, por vezes se comemora como salvação da humanidade a eficácia do combate a um vírus em cultura de células, sem que se entenda o número de validações necessárias até que se cure um ser humano. A velocidade das transformações parece tão natural que achamos o cúmulo que se demore mais de um ano para desenvolver uma vacina contra a Covid-19, quando, na realidade seria um recorde absoluto e uma vitória impressionante da ciência.
Precisamos fazer da ciência um assunto cada vez mais presente. Nas escolas, na imprensa, nas redes sociais. Não falo apenas das aplicações práticas, mas de toda a atividade científica e as maravilhas que vamos descobrindo sobre os seres vivos e o universo. Estimular perguntas é tão importante quanto dar respostas. Quais hipóteses são avaliadas em um estudo relevante? Quais as chances de dar certo? Como comprovar que realmente funciona? O que se busca em determinado processo de inovação tecnológica? Que mudanças a novidade pretendida provocará no mundo? Em quais setores? Haverá implicações éticas?
As instituições científicas e pesquisadores precisam fortalecer a sua comunicação com a sociedade. É imperativo mostrar a complexidade dos processos de se fazer ciência, da necessidade de investimentos contínuos em infraestrutura de pesquisa e formação de recursos humanos, da importância de fortalecer a ciência e inovação para nos fortalecermos como um país soberano, com desenvolvimento sustentável e menos desigualdades sociais. Mais do que tudo precisamos escancarar o encanto da incrível jornada que é fazer ciência!
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